Ela
tem 21 anos, é recém-formada em letras pela Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar), exibe em tatuagens pelo corpo frases de Guimarães Rosa e Manuel
Bandeira, adotou como pseudônimo um nome que faz referência a um personagem do
escritor russo Vladimir Nabokov e assume, sem problemas, ser garota de
programa. Gabriela Natália da Silva, ou Lola Benvenutti, mantém um blog em que
escreve contos baseados nas experiências com seus clientes e chama a atenção ao
tentar quebrar o tabu do sexo. “Sempre gostei de sexo, então tinha um desejo
secreto de trabalhar com isso e não há nada mais justo, faço porque gosto”,
afirmou em entrevista.
A
realidade de Gabriela sempre foi diferente da vida de uma parcela das garotas
de programa que são universitárias e optam por se prostituir para manter as
despesas com os estudos. "Tem uma categoria nos sites de acompanhantes que
são de universitárias e fazem isso porque fazem faculdade particular e precisam
pagar, mas eu nunca precisei disso, sou inteligente, fiz faculdade, optei por
isso, qual o problema?", questionou.
Natural
de Pirassununga (SP), se mudou para São Carlos para fazer faculdade, mas por temer
algum tipo de retaliação resolveu manter sua identidade como prostituta com
discrição até concluir o curso. “Fiquei com um pouco de medo de isso reverberar
de alguma forma na faculdade, então achei melhor terminar a graduação para
colocar o blog no ar”, disse.
O
site recebe cerca de duas mil visitas por dia e é nele que Lola posta sua
rotina como prostituta. Entretanto, vê diferença entre sua história e o
fenômeno Bruna Surfistinha, pseudônimo de Raquel Pacheco, ex-prostituta que fez
fama na internet e teve sua história publicada em livro e roteirizada em um
filme. “Ela teve uma vida diferente da minha, com outras oportunidades”,
comentou.
Além
de manter seus contos e servir como contato entre seus clientes, que chegam a
cinco por dia, o blog serve também para levantar discussão sobre o prazer no
sexo. “As pessoas são hipócritas, vivem de sexo, veem vídeo pornográfico, mas
não falam porque têm vergonha. Um monte de mulher entra no blog e fala que
adoraria fazer o que eu faço, mas não tem coragem; e dos homens escuto as
confissões mais loucas e cada vez mais esse tabu do sexo é uma coisa besta”,
avaliou.
Barreiras
Apesar da escolha em ser uma profissional do sexo, Gabriela não desistiu de
seguir carreira acadêmica ou dar aulas após a conclusão do curso de letras.
“Também quero dar aula, mas por hobby, e além disso também tem a questão
financeira, porque dando aula hoje você quase não se sustenta”, analisou. “Acho
que as duas coisas são difíceis de casar, é muito difícil que uma escola que
sabe o que eu faço me permita trabalhar com eles, vou ter que derrubar
barreiras”.
Ainda
este ano, ela pretende se mudar para São Paulo, onde vai continuar trabalhando
como garota de programa e acumulando um mestrado na Universidade de São Paulo
(USP). “Cansei um pouco de São Carlos e agora quero outras coisas, tanto que o
mestrado para o qual estou estudando é na USP, converso com alguns professores
e quero pesquisar na área de prostituição ou fetiche”, considerou.
Esse
tipo de assunto, segundo ela, já é seu objeto de estudo desde a adolescência.
“Desde os 14 anos estudo o sadomasoquismo, que hoje está ficando mais
popularizado com ajuda do livro ‘Cinquenta Tons de Cinza’, que é marginalizado
para quem curte, mas abriu um leque para as pessoas que não conheciam”, explicou.
Interesse
pelo sexo
O
interesse precoce por sexo começou com uma vontade íntima de deixar de ser
virgem, o que considerava ser um ‘fardo’. “Desde os 11 anos queria me livrar
desse fardo, mas perdi a virgindade com 13 anos e a primeira vez foi péssima,
com um homem de 30 anos que conheci pela internet”, relembrou.
No
início, Gabriela ficou em dúvida sobre o prazer causado pelo sexo.“Não fiquei
confortável, fiquei um tempo sem fazer pensando em como era possível as pessoas
falarem tanto disso, mas aí depois de um tempo eu fui gostando e a percepção
mudou”, revelou.
Segundo
Gabriela, nunca houve um episódio em sua vida que despertasse um interesse
incomum para sexo. “Todo mundo fica me perguntando qual foi o fato que
desencadeou isso, eu respondo que nada, meus pais foram ótimos, tive uma ótima
educação, entrei na faculdade direto, fiz uma boa universidade e só”, garantiu.
Relação
com a família Como a personagem Tieta, da obra de Jorge Amado, Lola causa
alvoroço quando retorna para sua cidade natal, mas a relação com a a família
atualmente é estável. “Eu não vou muito pra lá, sinto que toda vez que vou,
levanto uma poeira de discórdia e os vizinhos ficam comentando. Minha mãe já
desconfiava porque nunca pedia dinheiro para ela e a relação foi muito mais difícil
porque ela se importa muito com o que os outros dizem, mas a gente se fala”,
disse.
Com
o pai, militar da reserva, há uma relação de respeito e separação entre
Gabriela e Lola. “Meu pai ficou seis meses sem falar comigo, eu achei que fosse
pra vida toda, mas aí teve a minha formatura e ele veio. Na ocasião, disse que
a filha dele era a Gabriela, não a outra, deixando bem claro que não compactua
com isso. Mas ele ficou do meu lado e acho ele um herói porque não me
abandonou”, confessou.
Fonte: G1
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